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Brasil defende saída para impasse na OMC sobre tribunal (VALOR ECONÔMICO)

Órgão responsável por julgar apelos dos países sofre com bloqueio americano de indicação de juízes e está inoperante há anos

Por Marcos de Moura e Souza

O governo brasileiro voltou a defender nesta terça-feira uma saída para um impasse que já dura anos na Organização Mundial do Comércio.
O tema é a retomada de uma instância da OMC criada para julgar recursos de países que discordam de decisões envolvendo disputas comerciais. Esse órgão de apelação deixou de funcionar em grande medida pela posição dos EUA.
Desde o governo de Barack Obama (2009 a 2017), Washington tem adotado a posição de bloquear indicações de especialistas para assumirem novos mandatos como juízes nessa instância.
Sem o quadro de juízes, o órgão fica inoperante.
Nesta terça-feira, 27, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, teve uma reunião com a embaixadora americana Katherine Tai, que comanda o Departamento de Comércio dos EUA (USTR, na sigla em inglês). O encontro aconteceu em Abu Dhabi, onde participam da 13ª. Conferência Ministerial da OMC. O evento se estende até dia 29.

“Eles conversaram sobre agricultura e sobre reformas na OMC. O Brasil reafirmou a importância de reforma na OMC e do sistema de solução de disputas para o regime de comércio multilateral”, disse o Ministério das Relações Exteriores do Brasil em nota nas redes sociais. Washington tem bloqueado a indicação de juízes do órgão – cuja aprovação precisa de consenso. Alega que decisões na OMC vinham sendo marcadas por viés.
Argumentam também que, pelo tamanho de sua economia, diversas medidas americanas adotadas na área de comércio acabam afetando interesses de algum parceiro comercial, que pode levar o caso para a OMC.

O sistema de solução de disputas na OMC é formada por duas instâncias: o painel, que emite decisões sobre contenciosos comerciais entre países; e o órgão de apelação, que pode rever decisões do painel com base em contestações dos países afetados negativamente pelo primeiro julgamento.
“Não apenas os Estados Unidos, mas sobretudo os Estados Unidos, expressam insatisfação com o funcionamento do sistema e então tem havido um bloqueio sistemático à nomeação desses “juízes”, desses membros do tribunal de apelação”, disse ao Valor na semana passada a secretária de Comércio Exterior do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (Mdic), Tatiana Prazeres.
Prazeres representa o Mdic no encontro que vai até esta quinta nos Emirados Árabes Unidos.
O Brasil tem sido bastante ativo em disputas levadas à OMC. E já obteve vitórias significativas. Entre elas, a disputa entre a Embraer e o Canadá; o caso dos subsídios agrícolas que os europeus concediam para o setor de açúcar; e a disputa com os EUA envolvendo algodão. Houve ainda vitórias em relação ao suco de laranja nacional para exportação.
O país, segundo Prazeres, se ressente da ausência do órgão de apelações. “Isso faz com que hoje não haja um sistema em pleno funcionamento porque o segundo grau de jurisdição, o órgão de apelação, está disfuncional. Não há juízes nomeados capazes de avaliar e julgar um recurso.”
Um arranjo provisório estabelecido entre alguns parceiros comerciais tem servido de remendo para a falta do “tribunal” de apelações da OMC. Desse mecanismo provisório de arbitragem fazem parte China, União Europeia, Japão, Brasil, Canadá e outros países, afirma a secretária. Estados Unidos são o grande ausente desse mecanismo.
Apesar de fazer parte desse fórum provisório, o Brasil entende que se trata de uma alternativa inferior ao pleno funcionamento do órgão de apelação da OMC.
Welber Barral, advogado especializado em comércio internacional – sócio do BPP Advogados e que já atuou como painelista no sistema de solução de controvérsias -, lembra de um caso envolvendo o Brasil que está parado por falta de quem avalie e emita decisão do órgão de apelação. Trata-se de uma disputa com a Indonésia envolvendo carne de frango. O Brasil foi declarado vitorioso e a Indonésia fez uma apelação – que caiu no vazio.
Barral diz que além de Brasil, União Europeia, México e outros atores do comércio têm pressionado os EUA sobre o tema. “Há uma expectativa que se possa evoluir em relação a esse assunto na reunião ministerial em Abu Dhabi. E hoje esse tema depende, fundamentalmente, dos EUA”, diz Barral.

FONTE: https://valor.globo.com/brasil/noticia/2024/02/28/brasil-defende-saida-para-impasse-na-omc-sobre-tribunal.ghtml